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O USO DO PNCP COMO FONTE DE PREÇOS

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O Portal Nacional de Contratações Públicas não substitui o painel para consulta de preços

 

Ronaldo Corrêa
Comprador público federal, articulista, docente, especialista em Licitações e Contratos.

 

Além de ser prevista na Lei nº 14.133/2021 como elemento obrigatório dos Estudos Técnicos Preliminares[1] e do Termo de Referência[2], a estimativa de preços tem por objetivo garantir a compatibilidade com os valores praticados pelo mercado[3] e também serve de base para várias definições e decisões tomadas ao longo do processo administrativo de contratação, tais como o afastamento ou não do tratamento favorecido e diferenciado para ME/EPP[4], a fixação de parâmetros objetivos para o julgamento da proposta[5], a definição do marco temporal para contagem do prazo para reajuste[6], dentre outros. Daí a sua relevância para determinar o sucesso ou fracasso de uma contratação pública.

E para que a estimativa de preços seja de fato útil para o atendimento das diversas finalidade legalmente previstas, faz-se necessária a adoção de informações fidedignas, que representem preços efetivamente praticados no mercado, em condições minimamente similares às daquela contratação pública específica, levando em conta tanto as quantidades a serem contratadas, quanto o potencial de economia de escala e as peculiaridades do local de execução do objeto[7].

Há tempos que o Tribunal de Contas da União vem indicando como irregular o uso da cotação de preços diretamente com fornecedores como única fonte de informações[8]. E o legislador parece ter adotado tal jurisprudência quando da redação das normas sobre estimativa de preços constantes da Lei nº 14.133/2021, já que impôs diversas condições para o uso de tal fonte de informação de preços[9], tais como:

  • pesquisa direta com no mínimo 3 (três) fornecedores;
  • solicitação formal de cotação;
  • justificativa da escolha dos fornecedores; e
  • orçamentos com menos de 6 (seis) meses de antecedência da data de divulgação do edital.

Já em relação ao uso dos preços praticados pela própria Administração Pública em suas contratações, em que pese tais informações de preços gozarem de presunção de veracidade[10], nem sempre é adequado o uso sem alguma análise crítica. Inclusive, o legislador previu que tais valores devem ser devidamente atualizados, observado o índice de atualização de preços correspondente[11]. Ou seja, aplica-se o índice previsto no edital da licitação que deu origem àquela contratação específica[12].

E em relação aos referidos preços praticados pela própria Administração Pública, tem sido sistemático o uso do Portal de Contratações Públicas – PNCP[13] como ferramenta de busca de preços, já que se trata de um repositório nacional de informações sobre editais de credenciamento e de pré-qualificação, avisos de contratação direta, editais de licitação e respectivos anexos, atas de registro de preços, contratos e termos aditivos, além dos preços finais homologados[14].

No entanto, ao prever os parâmetros ou fontes de informações de preços a serem adotados na estimativa de preços, o legislador previu tanto o uso de “contratações similares feitas pela Administração Pública, em execução ou concluídas no período de 1 (um) ano anterior à data da pesquisa de preços, inclusive mediante sistema de registro de preços”[15], quanto o uso de “composição de custos unitários menores ou iguais à mediana do item correspondente no painel para consulta de preços ou no banco de preços em saúde disponíveis no Portal Nacional de Contratações Públicas (PNCP)”[16]. E como as informações constantes do PNCP são exatamente das contratações realizadas pela Administração Pública, acaba que tem ocorrido certa confusão entre o uso destes dois parâmetros.

Mas observe-se que mesmo o uso diretamente dos dados do PNCP não é isenta de riscos de integridade, como alerta o Tribunal de Contas da União[17] e levando em conta as conclusões recentes disponíveis no Relatório de qualidade de dados do PNCP[18]. Portanto, recomenda-se sempre uma análise crítica dos dados, especialmente em relação à especificação detalhada de cada item lá registrado, evitando-se o uso de preços de objetos cuja especificação diverge daquela usada no processo administrativo de contratação.

Note-se ainda que, tanto o painel para consulta de preços quanto o banco de preços em saúde, previstos na norma geral de licitação como parâmetros válidos para a estimativa de preços, devem estar disponíveis no PNCP. Fato este ainda não concretizado pelo Comitê Gestor da Rede Nacional de Contratações Públicas, responsável pela gestão do PNCP. Em que pese o Banco de Preços em Saúde – BPS, por exemplo, estar disponível para uso diretamente na página do Ministério da Saúde na internet[19], ainda não está disponível no PNCP, o que vincularia o seu uso para todos os órgãos da União, Estados, Distrito Federal e Municípios, nos termos da Lei nº 14.133/2021.

Da mesma forma, o painel para consulta de preços ainda não está disponível no PNCP, sendo que o Painel de Preços do Governo Federal não se confunde com a ferramenta nacional de pesquisa de preços a ser disponibilizada no PNCP, conforme consta inclusive de determinação recente do TCU, no sentido de “integração das ferramentas ‘Painel de Preços’ e do ‘Banco de Preços em Saúde’ ao PNCP, para fins de cumprimento ao disposto no inciso II do § 3º do art. 174 da Lei 14.133/2021”[20]. E além de não servir para atender à previsão legal de um painel de consulta de preços para uso nacional, o Painel de Preços do Governo Federal também possui pontos críticos, conforme indicado em auditoria da Controladoria-Geral da União[21]. Sendo que tal ferramenta está sendo inclusive desativada pela Secretaria de Gestão do Ministério da Gestão e Inovação, após o lançamento de uma nova ferramenta, interna ao sistema Compras.gov.br mas com a mesma finalidade[22].

De forma que, atualmente é operacionalmente inviável o uso do parâmetro previsto no inciso I do §1º do art. 23 da Lei nº 14.133, de 2021, pois ainda não está disponível no PNCP, assim como também não temos ainda acesso ao Banco Nacional de Notas Fiscais Eletrônicas, que não se confunde com iniciativas locais de disponibilização de acesso a dados de Notas Fiscais, como ocorre por exemplo no projeto Economiza Alagoas[23].

[1] Vide inciso VI do art. 18 da Lei nº 14.133, de 2021.

[2] Vide alínea i) do inciso XXIII do art. 6º da Lei nº 14.133, de 2021.

[3] Vide caput do art. 23 da Lei nº 14.133, de 2021.

[4] Vide §1º do art. 4º da Lei nº 14.133, de 2021.

[5] Vide inciso III do art. 59 da Lei nº 14.133, de 2021.

[6] Vide §7º do art. 25 da Lei nº 14.133, de 2021.

[7]  Vide caput do art. 23 da Lei nº 14.133, de 2021, in fine.

[8] Vide Acórdão 2816/2014-Plenário, Acórdão 1923/2016-Plenário, Acórdão 3010/2016-Plenário, Acórdão 1604/2017-Plenário, Acórdão 2787/2017-Plenário, Acórdão 1548/2018-Plenário, Acórdão 452/2019-Plenário, Acórdão 713/2019-Plenário, Acórdão 2102/2019-Plenário, Acórdão 3224/2020-Plenário , Acórdão 2704/2021-Plenário, Acórdão 2399/2022-Segunda Câmara, dentre outros na mesma linha.

[9] Vide inciso IV do §1º do art. 23 da Lei nº 14.133, de 2021.

[10] Vide item 17 do voto condutor do Acórdão 452/2019-Plenário:

“Ocorre que essa prática se antagoniza ao magistério jurisprudencial desta Casa de Contas que é remansoso ao assentar que os sistemas oficiais de referência da Administração Pública reproduzem os preços de mercado, e, por gozarem de presunção de veracidade, devem ter precedência em relação ao uso de cotações efetuadas diretamente às empresas que atuam no mercado.”

[11] Vide inciso II do §1º do art. 23 da Lei nº 14.133, de 2021.

[12] Considerando que tanto a Lei nº 8.666, de 1993 (Art. 55, III), quanto a Lei nº 14.133, de 2021 (Art. 92, V), fixam que os “os critérios, a data-base e a periodicidade do reajustamento de preços” são cláusulas necessárias em todo contrato.

[13] Previsto no art. 174 da Lei nº 14.133, de 2021, e acessível através do sítio eletrônico gov.br/pncp.

[14] Vide incisos III, IV e V do §2º do art. 174 da Lei nº 14.133, de 2021.

[15] Vide inciso II do §1º do art. 23 da Lei nº 14.133, de 2021.

[16] Vide inciso I §1º do art. 23 da Lei nº 14.133, de 2021.

[17] Vide Acórdão 1507/2024-Plenário: “não há funcionalidade no PNCP de realizar críticas ou verificações automatizadas acerca da consistência das informações transmitidas pelas plataformas, de maneira que a mera integração ao PNCP, não é, atualmente, uma garantia de integridade ou uma forma de controle sobre o que lhe é transmitido. Isso reforça as observações contidas no âmbito do Racom TC 027.907/2022-8, no sentido de que o conjunto informacional do PNCP tem um grau elevado de inconsistências”.

[18] Conclusão da análise de qualidade

A qualidade dos dados do PNCP impacta diretamente no potencial dos dados para alimentar ferramentas de análise como por exemplo uma ferramenta de comparação de preços. Tendo em vista o uso dos dados na construção de tais ferramentas, foi constatado que faz-se necessário melhorias primordialmente na descrição dos itens da contratação. O uso de códigos catalogados para cada item, como os códigos do Catálogo de Materiais (CATMAT) é uma possível solução para esta questão. Além disso, a adesão a padrões internacionais de publicação de dados de contratações públicas, como o OCDS, aprimoraria a interoperabilidade dos dados e facilitaria o seu uso por ferramentas de análise de terceiros.

[19] Acessível através do sítio eletrônico gov.br/saude/pt-br/acesso-a-informacao/banco-de-precos.

[20] Vide Acórdão 2209/2023-Plenário.

[21] Vide Relatório de Auditoria nº 852270, disponível no posto do Nelca acessível pelo link https://gestgov.discourse.group/t/relatorio-final-auditoria-n-852270-avaliacao-painel-de-precos/19095?u=ronaldocorrea.

[22] Conforme fala do Diretor do Departamento de Normas e Sistemas de Logística da Secretaria de Gestão e Inovação do Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos (DLOG/SEGES/MGI), no webinar realizado em 02/04/2024. Acessível pelo link https://youtu.be/Bm8b6PbEvJI?t=1881.

[23] Acessível através do link economizaalagoas.sefaz.al.gov.br.

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